2.13.2007

Rescaldo

Findo o debate, penduradas as chuteiras e resolvida a questão que dividiu a sociedade portuguesa nas últimas semanas resta-nos retirar algumas conclusões sobre o referendo do passado dia 11. Entre outras questões cingir-me-ei, por motivos de tempo, a três ou quatro pontos.

Primeira ilação a retirar: os cadernos eleitorais estão uma vergonha! A pergunta que se coloca no momento é para quando uma recontagem do número total de eleitores inscritos em Portugal? O objectivo é claro! Ora sendo o exercício do direito/dever de voto a base de qualquer democracia e atendendo ao facto que a população não o está a exercer, então teremos problema! Contudo não poderemos aferir da real dimensão do mesmo enquanto não tivermos números fidedignos para trabalhar na resolução daquele. No fundo, (um pouco como no aborto) enquanto não existirem números reais, não poderemos aferir se este é um grande problema ou se é apenas um problema assim-assim. Quantas almas penadas se contarão nos 56% de abstencionistas numa sociedade cada vez mais envelhecida como a nossa, pergunto eu! Com a aprovação do novo modelo de cartão de cidadão e as alterações que se avizinham, diria que este poderá ser o momento indicado para proceder à tal recontagem!

Seguidamente, a abstenção em si! Apesar do que afirmei supra certo é que, com os mesmos cadernos, 56% comparativamente aos 35% das últimas eleições legislativas é um valor muito elevado. Como causas apontaria em primeiro lugar o não envolvimento do PSD directamente nesta campanha, deixando uma boa franja do eleitorado “órfã” (a derrota do não a que Marques Mendes deu o seu apoio pessoal faz contudo com que saia apenas escamoteado destas eleições enquanto Ribeiro e Castro que envolve o seu partido assume politicamente mais uma derrota). Contudo, tais valores não dependerão apenas da falta de envolvimento daquele importante partido político. Em 1998 o não envolvimento do PS directamente foi apontado como argumento para a parca afluência às urnas, tal como o sol que se fazia sentir na altura, que obrigou a população a rumar ao Algarve. Alguns apontaram agora o frio e a chuva! São já conhecidas as quotas de culpa da meteorologia nos mais variados aspectos da vida dos portugueses, tais como o trânsito ou a produtividade, mas nestes casos é ridículo. Começo a acreditar que, efectivamente, os elementos não quererão nada com exercícios de democracia em Portugal. Contudo o problema da abstenção não é de agora! Existe um sentimento generalizado de decepção em relação à política. Neste caso a população parece ver no referendo um instituto pouco útil e incomodativo, a que os políticos recorrem para que a população substitua uma Assembleia da República eleita democraticamente a fim de esta poder lavar as mãos de decisões que lhe competem! Uma maçada no fundo! Fruto de um divórcio da população com a classe política talvez, mas definitivamente um sinal que não pode ser ignorado quanto ao futuro a dar a este tipo de consultas populares.

Quanto às forças partidárias aguardo as cenas dos próximos capítulos relativamente às novas bandeiras que o Bloco de Esquerda ou a JS irão apresentar, agora que esta batalha foi vencida, como tão bem me relembrou ainda ontem um grande amigo meu! Devo dizer que ambas as instituições me surpreenderam quanto ao comportamento que tiveram na hora da vitória. Digo que sinceramente esperava mais histerismo na hora de recolher louros e dividendos políticos sobre o resultado. Na TVI, até quando interpelado para analisar os resultados de uma sondagem sobre eventuais intenções de voto se as legislativas fossem naquele mesmo dia 11 (que curiosamente apresentavam o BE à frente do PP) Fernando Rosas me pareceu sóbrio de mais, ao considerar aqueles números algo fictícios. Sinal de maturidade política, talvez, ou mero acaso, quem sabe!? Penso que seria útil à sociedade se aquelas forças canalizassem desde já as suas forças para o combate a um dos maiores flagelos da actual sociedade portuguesa, que é a mortalidade nas estradas. No entanto o mesmo avisado amigo de há pouco me fez ver que a questão é unânime e pouco fracturante.

Claro que há outras questões demarcantes pendentes, como o são a eutanásia, o casamento e a adopção homossexual, ou a pena de morte. Sendo certo que nenhuma destas forças pretenderá alterar a situação da lei actual relativamente à última questão sobrar-lhes-ão três questões. Contudo parece-me que serão discussões algo precoces a ter no seio da conservadora sociedade portuguesa. Ainda assim a apostar numa delas seria na eutanásia.

Quanto à mudança que a maioria dos que votaram manifestou pretender aguardamos também com expectativa para ver o que sucederá quanto à nova lei. Se é correcto dizer-se que a campanha e o debate decorreram num tom pouco esclarecedor e em jeito de clubismo, não deixa de ser verdade que foram do lado dos derrotados emitidas algumas opiniões válidas e que poderão contribuir para a concretização de uma lei justa e amplamente aceite pela nossa sociedade.

ACR

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